O Marco Civil da Internet decorre de um projeto de lei que pretende estabelecer princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no país. Certamente possui implicações que vão muito além dos aspectos meramente formais da matéria, a despeito de ser importante a menção expressa de fundamentos, princípios, conceitos e, dentre outros, dos direitos e garantias do usuário. Apesar de oportuna a discussão acerca do sigilo, do registro de dados da navegação e das hipóteses em que seria cabível o acesso às informações mediante requisição judicial, há um aspecto que quase passa de forma despercebida de boa parte dos usuários: é virtualmente impossível o anonimato cabal na rede mundial de computadores. Reconhecidamente usuários sofisticados acabarão encontrando uma forma de dissimular suas reais intenções na internet, mas a maioria não. Em especial nós que a usamos para trabalho, estudo e lazer dificilmente nos daríamos conta de que deixamos uma trilha contundente acerca de seu uso. Este, aliás, é o centro desta reflexão: o usuário comum, aquele que se utiliza da grande rede numa frequência tal que pode nem se dar conta disso e que, justamente por isso, pode ficar vulnerável. Neste momento em que os debates são intensificados e os ânimos se acirram, com opiniões ora favoráveis ora contrárias ao Marco Civil, temos uma ocasião muito oportuna para refletir sobre o quão à vontade estamos conectados. Redes sociais, comunicadores instantâneos, videoconferências, mensagens eletrônicas, cursos, palestras, missas, cultos virtuais etc. O fato é que podemos passar boa parte de nosso tempo num sistema que registra cada passo que damos. É isto mesmo: o registro de nossa navegação já ocorre. A novidade estaria apenas em sua disciplina. Mas, o problema não está neste aspecto, o do controle de nossas pegadas na rede, diz respeito à provável inconsciência com que podemos fazê-lo. Tem gente que não se dá conta, por exemplo, do quão inadvertido é acessar a internet durante o trabalho ou estudo, principalmente quando isso não agrega nada de relevante ao compromisso que reclama atenção, sem cogitarmos sobre o desperdício de tempo e de recursos. Não precisamos nem ir muito longe: imagine alguém pesquisando de forma alucinada sobre suicídio, construção de bombas caseiras, doses fatais de remédios ou venenos etc. Ora, ninguém em sã consciência gastaria o seu tempo com isso se não houvesse um bom motivo... Bem, independentemente da aprovação do projeto de lei, a lição que fica é a de que a internet deve ser usada com responsabilidade e consciência. Semelhantemente ao uso do telefone, a reuniões em espaços reservados ou abertos, ou mesmo durante uma caminhada, há sempre o risco de que alguém esteja nos monitorando. Portanto, estará em larga vantagem aquele que dá seus passos com firmeza, que vive sem máscaras, que busca se informar sobre seus direitos e obrigações, que discerne o lícito do ilícito.
Lições do Marco Civil da Internet
Ariovaldo Esgoti
18/03/2014