Contadores deverão denunciar os próprios clientes


Num gesto de aparente autossabotagem o Conselho Federal de Contabilidade pode ter criado para os contadores a obrigação de denunciar os próprios clientes, tudo em nome de um senso ético discutível.

O descuido foi previsto na Resolução CFC nº 1.445/2013, ato administrativo por meio do qual o órgão disciplinou os efeitos dos artigos 9, 10 e 11 da lei nº 9.613/1998, com alterações até a Lei nº 12.683/2012.

Pelo texto em vigor, se, por exemplo, um dos clientes da contabilidade comprar ou vender ativos que não façam parte de seu objeto social, dentre outras situações, deverá denunciar a operação ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF.

De fato, o profissional da contabilidade não deve ser cúmplice de condutas criminosas, muito menos se esforçar para dissimular os ilícitos que forem, porventura, praticados por sua clientela.

Entretanto, isso não significa que deva, sem o apoio de um mandado judicial, quebrar o compromisso de sigilo que assume com aquele que lhe contrata.

Naturalmente, percebendo que o cliente não tem nem deseja desenvolver o grau de organização que é adequado à prestação de serviços de qualidade, o recomendável é que rescinda o contrato; sem, contudo, inviabilizar o exercício do contraditório e da ampla defesa daquele junto ao qual atuou como um dos prepostos.

Longe de tornar a profissão ainda mais respeitável, o Conselho Federal a colocou sob suspeita, pois, doravante, os contratantes não poderão mais submeter todas as operações aos cuidados de sua própria contabilidade... Deverão, ao menos, repensar a terceirização desses serviços.

O curioso é que nem o COAF almejou tanto. Bastaria aos dirigentes e estudiosos do Conselho Federal de Contabilidade terem dedicado um pouco mais de atenção à leitura de uma das manifestações do órgão de controle das atividades financeiras:
Art. 1º A presente Resolução tem por objetivo estabelecer normas gerais de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, sujeitando-se ao seu cumprimento as pessoas físicas ou jurídicas não submetidas à regulação de órgão próprio regulador que prestem, mesmo que eventualmente, serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, de qualquer natureza, nas seguintes operações... (Resolução COAF nº 24/2013) (grifos inexistentes no original)

Em outros termos, havendo a regulação por órgão próprio este ficaria livre para estabelecer as diretrizes aos seus, ainda que em sentido diverso, aliás, como acabou acontecendo no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB.

Assim sendo, o empresariado e seus departamentos jurídicos devem se deter sobre o caso e analisar o curso de ações mais indicado, em função das particularidades envolvidas, preferencialmente rio acima. Afinal, o Direito não socorre aos que dormem.