Fundamentalismo


A crescente militância ácida entre materialistas expõe uma das faces nada amistosas do ateísmo: a do ódio por tudo que remete ao sagrado ou a questões de fé. É certo que nem todo ateu pensa ou age dessa forma, mas, em especial, quem sai do sistema religioso sem que tenha sanado suas dores ou curado suas feridas, assim permanecendo, corre o risco de se tornar fundamentalista, caso já não o seja, ou de ter agravado o quadro existente. E isso por uma razão que no fundo é bem simples: quer faça parte ou não de algum segmento filosófico ou religioso, o portador desse tipo de transtorno tende a projetar no outro o ódio do qual se alimenta, tentando se esquivar da parcela de responsabilidade que lhe cabe na escolha do rumo de sua própria vida. É algo como a "Síndrome de Dom Quixote", cuja potencial patologia levava o protagonista a combater "Moinhos de Vento" (a despeito de a obra literária oferecer ainda outras perspectivas). O fato é que o fundamentalismo, seja religioso, seja não religioso, só é erradicado por meio da emancipação do sujeito, pois, independentemente de ter optado pela via da espiritualidade ou, conforme o caso, aderido a um ceticismo saudável, é a verdadeira maturidade ou o pensamento realmente livre que liberta.