Nossa Língua Portuguesa e a Operação Lava Jato


Há muito tempo a classe política brasileira tem tido o dom de surpreender, aproveitando mesmo as oportunidades mais remotas para deixar suas marcas nefastas na sociedade. Para decepção geral, atualmente se consagram atores tragicômicos como "Nunca antes na história deste país". Se há algo que as várias operações da Polícia Federal já conduzidas conseguiram comprovar é que a inventividade desse pessoal não tem limites, e que a regra nesse meio é o desprezo ao bem comum. O curioso é que quando ameaçados por algum dos desdobramentos dessas operações, mesmo inimigos ferrenhos são capazes de demonstrar um consenso que noutro contexto seria digno de admiração. Tomemos como exemplo as recentes delações da empresa construtora que tem merecido destaque nas mídias. A defesa praticamente unânime da corja implicada tem sido: "Nunca recebemos ou cobramos nada que fosse indevido de ninguém". Eles agem como se ignorassem as lições mais básicas da nossa língua ou se subestimassem a nossa capacidade de interpretação. Bem, o analfabetismo funcional é tamanho que talvez não se trate de subestimar, mas de apostar num cavalo potencialmente vencedor. De qualquer forma, pego-me a refletir sobre o que realmente estaria sendo dito quando se afirma que nunca foi recebido nada indevido. Segundo os melhores dicionários: o indevido não é objeto de obrigação ou de dívida, não corresponde ao exercício de um direito. Enfim, trata-se daquilo que não é devido. Ora, se não receberam ou cobraram nada que fosse indevido, o significado óbvio é que tudo o que foi recebido ou cobrado era, na perspectiva desses meliantes, devido. Leia-se, objeto de obrigação ou dívida, exercício de um pretenso direito. O fato é que nessa farra com o dinheiro público não tem esquerda nem direita ou centro, já que "É tudo farinha do mesmo saco", como diriam nossos avós. Tomara que cheguemos às eleições com mais consciência, que nos lembremos das estratégias dessa turma, inclusive quando apoia seus herdeiros políticos. Certamente, os resultados dos últimos pleitos não têm sido animadores, mas ainda há esperança. Afinal, se criamos tais dificuldades ou consentimos com sua existência, também somos capazes de corrigir o quadro ou colaborar para que a mudança se instale em definitivo. A despeito dos desafios, o caos que assola o país é bem-vindo, já que nos possibilita o acesso a novas edificações. Além do mais, "Não se faz omelete sem quebrar os ovos".