Desde a publicação da Lei Complementar nº 123/06 as microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional contam com a possibilidade de constituírem uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) voltadas à realização de negócios de compra e venda de bens e serviços para os mercados nacional e internacional (Art. 56).
Na ocasião o Legislador dispôs sobre os requisitos a serem observados por tal modelo societário, cujas previsões tornariam virtualmente impossível sua confusão com qualquer outro tipo existente no Direito de Empresa que vigora no país:
Art. 56...
§ 2º A sociedade de propósito específico de que trata este artigo:
I - terá seus atos arquivados no Registro Público de Empresas Mercantis;
II - terá por finalidade realizar:
a) operações de compras para revenda às microempresas ou empresas de pequeno porte que sejam suas sócias;
b) operações de venda de bens adquiridos das microempresas e empresas de pequeno porte que sejam suas sócias para pessoas jurídicas que não sejam suas sócias;
III - poderá exercer atividades de promoção dos bens referidos na alínea b do inciso II deste parágrafo;
IV - apurará o imposto de renda das pessoas jurídicas com base no lucro real, devendo manter a escrituração dos livros Diário e Razão;
V - apurará a Cofins e a Contribuição para o PIS/Pasep de modo não-cumulativo;
VI - exportará, exclusivamente, bens a ela destinados pelas microempresas e empresas de pequeno porte que dela façam parte;
VII - será constituída como sociedade limitada;
VIII - deverá, nas revendas às microempresas ou empresas de pequeno porte que sejam suas sócias, observar preço no mínimo igual ao das aquisições realizadas para revenda; e
IX - deverá, nas revendas de bens adquiridos de microempresas ou empresas de pequeno porte que sejam suas sócias, observar preço no mínimo igual ao das aquisições desses bens...
§ 4º A microempresa ou a empresa de pequeno porte não poderá participar simultaneamente de mais de uma sociedade de propósito específico de que trata este artigo.
§ 5º A sociedade de propósito específico de que trata este artigo não poderá:
I - ser filial, sucursal, agência ou representação, no País, de pessoa jurídica com sede no exterior;
II - ser constituída sob a forma de cooperativas, inclusive de consumo;
III - participar do capital de outra pessoa jurídica;
IV - exercer atividade de banco comercial, de investimentos e de desenvolvimento, de caixa econômica, de sociedade de crédito, financiamento e investimento ou de crédito imobiliário, de corretora ou de distribuidora de títulos, valores mobiliários e câmbio, de empresa de arrendamento mercantil, de seguros privados e de capitalização ou de previdência complementar;
V - ser resultante ou remanescente de cisão ou qualquer outra forma de desmembramento de pessoa jurídica que tenha ocorrido em um dos 5 (cinco) anos-calendário anteriores;
VI - exercer a atividade vedada às microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional.
Contudo, ao regulamentar o artigo da lei, o Poder Executivo previu a constituição de um consórcio simples, em vez de uma SPE, o que, além de representar um retrocesso quanto ao alcance da previsão legislativa, restringe o potencial mercadológico visado com o modelo inicialmente autorizado.
Neste sentido, de acordo com o Decreto 6.451/08:
Art. 1º As microempresas e as empresas de pequeno porte optantes pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - SIMPLES NACIONAL poderão constituir, nos termos do art. 56 da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006, consórcio simples, por tempo indeterminado, tendo como objeto a compra e venda de bens e serviços para os mercados nacional e internacional.
§ 1º A microempresa ou empresa de pequeno porte não poderá participar simultaneamente de mais de um consórcio simples.
§ 2º O consórcio simples não poderá ser concomitantemente de venda e de compra, salvo no caso de compra de insumos para industrialização.
Art. 2º O consórcio simples não tem personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade, salvo se assim estabelecido entre as consorciadas.
Art. 3º O contrato de consórcio simples e suas alterações serão arquivados no órgão de registro público competente e deverá conter, no mínimo, cláusulas que estabeleçam:
I - a denominação, a finalidade, o endereço e o foro;
II - a identificação de cada uma das consorciadas que integrarão o consórcio simples;
III - a indicação da área de atuação do consórcio simples, inclusive se a atividade se destina a compra ou venda;
IV - a forma de deliberação sobre assuntos de interesse comum, com o número de votos que cabe a cada consorciada;
V - o direito de qualquer das consorciadas, quando adimplentes com as suas obrigações, de exigir o pleno cumprimento das suas cláusulas;
VI - a definição das obrigações e responsabilidades de cada consorciada, e das prestações específicas, observadas as disposições da legislação civil;
VII - as normas sobre recebimento de receitas e partilha de resultados;
VIII - as normas sobre administração do consórcio simples, contabilização e representação das consorciadas e taxa de administração, se houver; e
IX - a contribuição de cada consorciada para as despesas comuns, se houver.
A comparação das ambas as disposições leva à conclusão de que a Lei autorizou em caráter de exceção a participação de empresas optantes pelo regime tributário do Simples Nacional (ME"s e/ou EPP"s) em um sociedade empresária especial, enquanto o Decreto regulador seguiu via distinta, adulterando o modelo de forma a restringi-lo em vários aspectos.
Visto que um simples decreto é incapaz de introduzir mudanças na Lei, é recomendável aos interessados na matéria que busquem avaliar o impacto de ambas as previsões nos segmentos explorados, adotando o tipo que se revele o mais adequado à conquista do desempenho estimado pelos estudos de viabilidade.