A ilusão da artista


Uma de nossas artistas divulgou um texto no qual procura expor suas razões para o uso da maconha, revelando-se completamente despreocupada sobre se teria feito ou não apologia ao consumo da droga, conclusão que deixaria a cargo do próprio leitor. Conforme indicou, faz uso regular da erva porque: a liberta, quer, é rebelde, acha contraditório, quer provocar a sociedade, gosta do que lhe é proporcionado, provoca alegria, é um ato político, é do contra, quer desfazer o tabu, voa enquanto faz música e canta sob os efeitos da substância, é uma entrega brilhante, é criativa e gosta de estar estimulada, percebe coisas que não enxerga no dia a dia, é perfumada, quer fazer com que as pessoas pensem e se livrem do preconceito com relação a tudo... Que a artista se dispôs a flertar com o ilícito é fato, pois: consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União, as quais estão proibidas em todo o território nacional... Aliás, é preciso considerar que a Lei nº 11.343, de 2006, concentrou-se no tema, dispondo inclusive a respeito das consequências que podem recair sobre as condutas ali tipificadas... Estado alterado de consciência, liberdade e criatividade são os conceitos essenciais implícitos na manifestação pela qual a jovem busca fundamentar o aspecto político de sua postura, imaginando ainda que sua percepção é realçada pelos efeitos da substância em questão. Ocorre que o raciocínio proposto se constrói a partir de premissas equivocadas, visto que o estado alterado de consciência, que lhe tornaria possível a expressão criativa e que lhe deixaria livre dos grilhões da sociedade ou da vida como um todo, é, na realidade, fruto de sentidos entorpecidos. Levando-se em conta que ela é dependente desse tipo de substância, sem a qual não teria, como diz, estímulos para enfrentar o dia a dia, o comportamento confessado acaba funcionando como uma espécie de pedido de socorro de alguém que perdera o controle sobre sua própria vontade, que é incapaz de se defender da autoilusão que a escraviza. Creio que lhe tenha faltado sabedoria para pesquisar formas bem mais seguras, além de lícitas, para a obtenção de estados alterados de consciência, que inclusive propiciariam as expressões que ela vinculou ao consumo da droga. Com o uso, por exemplo, de técnicas de meditação, oração ou relaxamento a artista poderia ter alcançado resultados ainda melhores do que os que foram listados, sem se submeter aos efeitos colaterais que abraçara, dentre os quais se destaca a perda de sua própria capacidade de autodeterminação, o que no caso é um flagrante contrassenso.