É pouco provável que uma pessoa bem intencionada ou esclarecida rejeitasse os direitos e as garantias consagrados pela Ordem Constitucional vigente, como, por exemplo: "é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias..." (Art. 5º). Entretanto, isso não significa que estariam legitimadas quaisquer condutas, particularmente as que pudessem pôr em risco os bens tutelados pelo Direito, até porque, dentre outros, o próprio Código Penal coíbe algumas dessas práticas: "Estelionato - Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento... Charlatanismo - Art. 283 - Inculcar ou anunciar cura por meio secreto ou infalível... Curandeirismo - Art. 284 - Exercer o curandeirismo: I - prescrevendo, ministrando ou aplicando, habitualmente, qualquer substância; II - usando gestos, palavras ou qualquer outro meio; III - fazendo diagnósticos"... Em tempos em que pequenas igrejas, de fato, se tornaram grandes negócios, é inconcebível que as pessoas de boa fé continuem correndo o risco, às vezes diário, de serem enganadas por um discurso que, em regra, é meticulosamente preparado para soar bem aos ouvidos das vítimas em potencial de mercenários, que costumam se apresentar travestidos de sacerdotes, gurus, sábios, inspirados etc. Assim sendo, por mais que alguém se esforce para dissimular suas reais intenções, até mesmo invocando o salvaguardo Constitucional, não há margem para que se admita uma espécie de institucionalização do estelionato, hipótese em que os leigos sob a tutela do agente seriam espoliados sob o pretexto de serviço divino. Por outro lado, enquanto o Estado não faz a sua parte, efetivamente fiscalizando, coibindo e punindo os abusos ou a exploração da fé, é necessário que o interessado aprenda a distinguir o verdadeiro do falso, o bem do mal intencionado, enfim, o médico competente do impostor. Em meio às estratégias das quais se poderá lançar mão, um passo imprescindível é estudar cuidadosamente as origens do movimento em questão e o seu modus operandi, além do currículo da liderança. Afinal, o erro é incapaz de alterar o código genético de sua prole. Ou seja, a qualidade da árvore ainda é desvendada pelos seus frutos.
O direito ao livre exercício de culto religioso
Ariovaldo Esgoti
09/05/2014